Resíduos de Brumadinho já matam os peixes do Rio São Francisco

Os
rejeitos da barragem do Córrego do Feijão, que rompeu no dia 25 de janeiro, já
atingem a bacia do Rio São Francisco causando a morte de peixes e, em alguns
pontos, deixando a água imprópria para consumo da população.

Por
JOANA OLIVEIRA (EL PAIS – BRASIL)

Um
dos maiores temores dos ambientalistas depois do rompimento da barragem da Vale
Córrego do Feijão, em Brumadinho, no dia 25 de janeiro, concretizou-se: os
rejeitos da barragem já contaminaram o rio São Francisco. Os dados recolhidos
pela Fundação S.O.S. Mata Atlântica —que monitora o impacto ambiental da
tragédia através de uma expedição pelo rio Paraopeba (afluente do Velho Chico)—
mostram que alguns trechos do Alto São Francisco já estão com água imprópria
para uso da população.
No
relatório “O retrato da qualidade da água nas bacias da Mata Atlântica”,
publicado nesta sexta-feira, a ONG explica que, entre os dias 8 e 14 de março,
recolheu amostras de água em 12 pontos do rio e constatou que nove deles
estavam em condição “ruim” e três em situação “regular”.
No
trecho a partir do Reservatório de Retiro Baixo, entre os municípios de
Felixlândia e Pompéu, em Minas Gerais, até o Reservatório de Três Marias, no
Alto São Francisco, a turbidez (transparência da água) estava acima dos limites
legais definidos pela Resolução 357 do Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama) para a qualidade da água doce superficial.
Em
alguns locais, esse indicador chegou a ser verificado entre duas e seis vezes
mais que o permitido pela resolução. “Além disso, as concentrações de ferro,
manganês, cromo e cobre também estavam acima dos limites máximos permitidos
pela lei”, acrescenta em entrevista ao EL PAÍS Malu Ribeiro, assessora da
S.O.S. Mata Atlântica especialista em água.
Ribeiro
explica que “o medo é que aconteça o mesmo que ocorreu com o rio Doce no
desastre de Mariana”: em novembro de 2015, o rompimento de duas barragens da
mineradora Samarco gerou um tsunami de rejeitos, matou 19 pessoas e deixou um
rastro de destruição ao longo de mais de 600 quilômetros da Bacia do Rio Doce,
até o litoral do Espírito Santo. “Depois de percorrer 120 quilômetros no Alto
São Francisco com pescadores locais, observamos muitos trechos com perda de
fauna aquática. As aves também desapareceram do entorno”, lamenta a
pesquisadora.
Os
dados da S.O.S Mata Atlântica mostram que o Reservatório de Retiro Baixo está
segurando o maior volume dos rejeitos de minério que vem sendo carreados pelo
Paraopeba. Mas, apesar das medidas tomadas, os contaminantes mais finos estão
ultrapassando o reservatório e descendo o rio. Segundo Ribeiro, apesar de não
conter rejeitos de minério pesado, essa pluma contaminante representa um risco
para a população. “Como a cor do rio não mudou em alguns trechos, os ribeirinhos
podem ter a falsa sensação de segurança em relação à sua qualidade. Os
pescadores mais experientes já deixaram de pescar nesses locais, mas os leigos
ainda podem consumir a água sem conhecer o perigo. É um conta-gotas de veneno”.
A
pesquisadora explica que há possibilidade de limpeza do São Francisco, mas que
isso vai depender da capacidade dos reservatórios de Três Marias e Retiro
Baixo, que devem funcionar como barreira para conter os rejeitos mais pesados,
e de um plano das autoridades para recuperar as nascentes da região. “É um
processo que pode levar décadas”, afirma Ribeiro. Ela e companheiros da ONG
entregaram o relatório à Câmara dos Deputados e ao Ministério Público na
quarta-feira e pretendem retomar a expedição para conversar com os ribeirinhos.
“Nosso objetivo é levar respostas e instrumentos para as comunidades que não
estão sendo informadas dos riscos que correm”, diz a especialista.

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